terça-feira, 30 de setembro de 2014

Dadaísmo: 1916-23

A nona hora (1999) é uma das instalações de Maurizio Cattelan. A instalação consta de uma escultura muito realista do papa João Paulo II, agarrando-se desesperadamente à sua cruz processional, esmagado por um meteorito que, aparentemente, entrou pelo telhado espalhando cacos de vidro em um tapete vermelho. O título da obra remete a hora da morte de Cristo na cruz, a nona hora, de acordo com a teologia cristã.



Algumas perguntas sobre a obra:

Por que a obra A nona hora é classificada como arte?

E se ela estivesse em uma vitrine de uma loja, as pessoas a olhariam?

Em 2006 alguém pagou 3 milhões de libras pela obra, e páginas de jornais foram dedicadas à discussão de seus méritos. Assim, o artista se beneficia do status elevado de que os museus e galerias de arte moderna gozam em nossa sociedade. Sim, porque paralelo ao mundo da arte, nós temos o mercado da arte.

Em A nona hora, Cattelan está questionando a crença das pessoas na arte. Catellan ridiculariza o mundo que negocia e as próprias pessoas que o pagam para isso.

O dadaísmo foi um movimento artístico fundado no início do século XX por um grupo de artistas. Este movimento expressou decepções com o fracasso das ciências, da religião e da filosofia existentes até então, pois todos esses conhecimentos se revelaram incapazes de evitar a grande destruição que assolava a Europa. O dadaísmo oferecia uma alternativa baseada na conduta irracional, ilógica e desordenada.

Cabaret Voltaire. Clube noturno criado em 1916, em Zurique, formado por um grupo de jovens artistas e escritores. O objetivo era convidar artistas a comparecer e apresentar números musicais e leituras .
Um dos artistas que se apresentou no cabaré foi Tristan Tzara. Tzara ficou amido de Hugo Ball, idealizador do espaço.

Os dadaístas criaram um movimento anárquico. E o que eles eram contra? Contra o establishment! Contra a sociedade! Contra a religião! Contra a arte!

Só que isso não bastava. Eles precisavam estar inseridos dentro do próprio establishment artístico, do qual eles protestavam.

No dia 14 de julho de 1916, instituiu-se a chegada de um novo movimento por meio de uma leitura pública de um manifesto no Waag Hall, em Zurique.

" O dadaísmo é uma nova tendência na arte. É possível perceber isso pelo fato de que até ontem ninguém sabia coisa alguma sobre ele, e amanhã todos em Zurique estarão falando a seu respeito. A palavra dada vem do dicionário. É o que há de mais simples. Em francês ela significa "cavalinho de pau". Em alemão significa "até logo", em romeno "sem dúvida"...uma palavra internacional. Como podemos alcançar a eterna beatitude? Dizendo dada. Como podemos ficar famosos? Dizendo dada...até ficarmos loucos [e] perdermos a consciência. como podemos nos livrar do jornalismo, dos vermes, de tudo que é bom e direito, bitolado, moralístico, europeizado, debilitado? Dizendo dada." (Hugo Ball)

O absurdismo era uma tendência antirracional que tivera início em Paris na segunda metade do século XX com os poetas simbolistas franceses. Paul Verlaine, Stéphane Mallarmé e Arthur Rimbaud estavam entre os principais poetas do movimento.

A peça de Alfred Jarry, chamada Ubu rei, foi encenada pela primeira vez em dezembro de 1896. A plateia vaiou e todos voltaram para casa infelizes. Mas, o que todos não sabiam, é que Jarry havia criado um drama absurdista, chamado mais tarde de "teatro do absurdo". E o dadaísmo foi o mais intelectual dos movimentos artísticos.

Uma adaptação do Esperando Godot de Samuel Beckett, pode ser visualizada aqui: https://www.youtube.com/watch?v=kTsMYrUU8WQ
 
Outra referência são os romances de Franz Kafka.

A época foi marcada por centenas de homens massacrados. O absurdismo, ou ler três poemas diferentes, ao mesmo tempo, parece tolo. Mas era apenas uma crítica à guerra, onde homens morreram lado a lado. Como disse Hugo Ball: "O que estamos celebrando é ao mesmo tempo uma palhaçada e uma missa de réquiem".

Um novo sistema baseado no acaso deu vida literária na forma de poemas dadaístas. Consistia no recorte de várias palavras de jornais colocadas e um saco. Em seguida eram retiradas ao acaso e coladas. O resultado era uma mensagem dadaísta.

Da mesma maneira, Jean Arp que fez parte do grupo O Cavaleiro Azul, de Kandinsky, fez uma obra dadaísta utilizando papier collé, e nasceu a Colagem com quadrados dispostos segundo as leis do acaso (1916-17). Arp deixou vários fragmentos de papel cair sob um papel-cartão, e colou-os onde pousaram.



Arp viajou pela Europa e conheceu Kurt Schwitters. Basicamente, Schwitters vasculhava lixo em caçambas. Botões, arames, jornais velhos, etc. Revolving (1919) é uma composição com lixo, mas é elegante e sofisticado. O uso do refugo era uma metáfora para um mundo destruído pela guerra que o artista pensava que não podia ser reconstruído.



Merz - Foi o nome dado a uma centena de colagens, feitas pelo artista, com materiais "achados" do lixo.



Merzbau - Casa feita de lixo, cheia de despojos e relíquias. Foi destruída na Segunda Guerra Mundial. As imagens abaixo é da casa reconstruída em 1984.



 
 
 
Artistas como Hannah Hoch, Raoul Hausmann e George Grosz forma pioneiros da fotomontagem, recortando fotografias de revistas para criar colagens absurdas e satíricas. O objetivo dos artistas era criar uma nova realidade, social e artisticamente.
 
Em O crítico de arte (1919), Raoul Hausmann satirizou os jornalistas, cujas críticas de arte podiam ser compradas - ou pelo menos influenciadas - com dinheiro, como mostrado pela colocação de um pedaço de cédula atrás do pescoço do crítico. Ao rabiscar várias linhas pretas sobre os olhos do crítico, simbolicamente obscurecendo sua visão, Hausmann também indica que o julgamento do crítico de arte, como o de qualquer instituição, é deficiente.
 
 
 
A fascinação pelo absurdo encantou dois artistas: Francis Picabia e Marcel Duchamp. Os dois artistas mudaram-se para Nova York em 1915, e acabaram conhecendo Man Ray.
 
Francis Picabia, assim como os outros artistas, realizava obras que questionava as atitudes em relação ao processo artístico, tais como L'Oeil Cocodylate (1921) (abaixo), feita a partir de saudações e assinaturas de amigos.
 
 
 
Duchamp levou a iconoclastia do dadaísmo ao extremo com seus "ready-mades" - objetos funcionais fabricados industrialmente exibidos com pouca ou nenhuma alteração. O mais famoso é Fonte (1917), um mictório deitado sob um pedestal com a assinatura "R.Mutt" - uma fábrica de urinol. O dadaísmo questionava o propósito da arte e seu valor cultural; Duchamp questionava o que constituía a obra de arte e, em uma sociedade materialista, atacava as noções de valor material.
 
 
 
 

Em um de seus passeios por Paris, Marcel Duchamp comprou um cartão postal com uma reprodução de Mona Lisa de Leonardo da Vinci. Desenhou um bigode e um cavanhaque, datou-o e escreveu L.H.O.O.Q.



A pintura da Mona Lisa sempre teve seu status e ícone religioso. Duchamp estava sendo irônico e sua atitude tinha significado, desfigurando uma imagem considerada sagrada.
O francês usava a arte como forma de quebrar barreiras. Sob o pseudônimo de Rrose Sélavy, seu lado travesti transparecia.
O artista e fotógrafo norte-americano Man Ray fotografou Rrose, ou seja, Marcel Duchamp.

Belle Haleine (1921) é uma obra dadaísta carregada de sentido. Duchamp retirou o rótulo original de um frasco de perfume, substituindo por uma foto sua Rrose/Duchamp. Abaixo de Rrose está uma marca inventada, Belle Haleine, que significa "belo alento". Embaixo está a palavra Eau de Voilette que significa "água de véu". E dois lugares são mencionados no rótulo - Nova York e Paris -, cidades  de Rrose/Duchamp.



A obra foi adquirida por Yves Saint Laurent. Depois que este morreu, a obra foi vendida por 11.489.968 dólares.

Repetindo: paralelo ao mundo da arte existe o mercado da arte!

Atualmente, Maurizio Cattelan continua ousado e irreverente. Seu trabalho expressa uma crítica mordaz à autoridade e ao abuso de poder.

O antimovimento artístico converteu-se em surrealismo, em 1924.

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